Pois é, galera… se você é daqueles que acompanha o universo dos games há algum tempo, já deve ter percebido: tem gente sumindo dos sites e canais que a gente sempre visitou. E não é só impressão não. Dados recentes mostram que, nos últimos dois anos, quase um quarto de todos os jornalistas gamers do mundo foram demitidos — algo em torno de 1200 profissionais. Sim, você leu certo.
E aí, quando a gente vai atrás das justificativas, esbarra naquelas desculpas de sempre: “ah, foi a pandemia”, “o Google mudou o algoritmo”, “a IA tá roubando emprego”… Sinceramente? Acho difícil engolir essa versão sem questionar. Será mesmo que o problema é só externo? Ou será que a crise de credibilidade, a polarização ideológica e a falta de identidade com o público gamer não têm nada a ver com isso?
Na minha opinião, é hora de encarar a realidade: o jornalismo de games está passando por uma transformação dolorida — e talvez, só talvez, parte desse remédio amargo seja consequência de escolhas que eles mesmos fizeram.
O “Descasamento” Entre a Mídia Tradicional e o Público Gamer
Vamos falar a verdade? Existe um abismo gigante entre o que a redação de muitos sites especializados acha “relevante” e o que o jogador comum, que compra jogo com suor do seu trabalho, realmente quer ler.
Enquanto o João, que trabalha o dia inteiro e chega em casa querendo relaxar com um game, está procurando uma análise honesta sobre a performance, a jogabilidade e se aquele lançamento caro vale o preço pedido, ele muitas vezes se depara com artigos questionando se o Sonic deveria ser gay ou se o Nemesis de Resident Evil 3 é um símbolo machista por perseguir a Jill Valentine.
Não é sobre ser contra discussões sociais. O problema é a prioridade. A sensação que fica é que a pauta ideológica vem primeiro, e o videogame em si — aquele produto que nós amamos e no qual investimos — vira um mero pano de fundo, quase um incômodo. O foco deixa de ser o jogo e passa a ser a militância.
Isso gera um cansaço no público. Uma desconfiança profunda. Como confiar na nota de um crítico que claramente valoriza mais o “checklist de representatividade” do que a qualidade técnica e a diversão que o jogo proporciona? A resposta, na prática, tem sido migrar em massa para criadores de conteúdo independentes — youtubers e streamers que, mesmo com suas opiniões enviesadas, são transparentes em suas paixões e frustrações. Com eles, o jogador sente que está conversando com um amigo, não sendo doutrinado por um colunista distante.
A Crise de Credibilidade: Notas Compradas e Análises Desconectadas
Lembra quando a gente olhava para a nota da Metacritic ou de um site grande antes de comprar um jogo? Esse hábito está em extinção, e por um motivo muito claro: a credibilidade dessas avaliações foi pro ralo.
A comunidade percebeu um padrão assustador: jogos com narrativas “progressistas” muitas vezes recebem notas infladas, enquanto títulos que não seguem essa cartilha são criticados com um rigor estranhamente seletivo. O caso mais emblemático recente foi o de The Last of Us Part II, onde qualquer crítica à narrativa era facilmente enquadrada como “discursos de ódio” por parte de alguns jornalistas, invalidando qualquer discussão legítima sobre pacing, desenvolvimento de personagem e escolhas de roteiro.
Isso sem falar na pouca habilidade técnica que ficou escancarada em diversos vídeos virais. Jornalistas travando em tutoriais básicos de Cuphead ou Tomb Raider passam uma imagem de despreparo. Como um profissional que cobre a indústria não domina o básico da linguagem dos games? É como um crítico de gastronomia que não sabe usar talheres.
O resultado é que a opinião do “Zé da Live”, que jogou 40 horas e mostrou cada glitch, cada acerto e cada erro, vale infinitamente mais do que a análise de 800 palavras de alguém que claramente não tem prazer em estar ali.
O Impacto da IA, do “Ctrl+C Ctrl+V” e o Futuro do Jornalismo de Games
Agora vamos falar de um elefante na sala: a tal da Inteligência Artificial. Muitos editores estão usando a IA como bode expiatório para justificar os cortes de vagas, mas a realidade é bem mais complexa. A IA não está substituindo bons jornalistas; está substituindo funções que já se tornaram mecânicas e descartáveis.
Pensa comigo: qual a diferença entre um artigo gerado por IA e aquele velho hábito de copiar uma matéria gringa, jogar no Google Tradutor e publicar com meia-dúzia de ajustes? Em muitos casos, a IA até faz um trabalho mais rápido e com menos erros de gramática. O problema de base é o mesmo: a falta de originalidade, de apuração própria e de uma voz autoral.
Sites que se apoiam nesse modelo de “retransmissão de notícias” se tornaram completamente dispensáveis. Por que eu, como leitor, vou clicar em uma tradução meia-boca na IGN Brasil se posso ler a matéria original, e com horas de antecedência, na IGN Americana? Ou pior: por que não assistir a um vídeo de 3 minutos de um youtuber que vai direto ao ponto, sem rodeios?
A IA apenas escancarou uma crise que já existia: a falta de propósito em muito do conteúdo produzido. Ela é uma ferramenta incrível para otimizar processos, mas não é capaz (pelo menos por enquanto) de criar o que o jornalismo games mais precisa hoje: confiança e conexão humana.
E Agora? O Futuro é dos Criadores de Conteúdo?
Olhando para esse cenário, fica a pergunta: o jornalismo de games tradicional vai morrer?
Na minha visão, não. Mas ele vai ter que se reinventar radicalmente. Os grandes veículos não podem mais ser apenas “fábricas de notícias”. Eles precisam se tornar fontes de confiança e análise aprofundada.
Isso significa:
- Investir em jornalismo investigativo: A cobertura de bastidores, como a que o Jason Schreier faz, mostra que há um público faminto por histórias que vão além dos press releases.
- Valorizar especialistas: Colunistas que são verdadeiramente especialistas em um gênero, um estúdio ou um aspecto técnico dos games.
- Ser transparente e humano: Assumir opiniões de forma clara, abrir espaço para o debate honesto e, acima de tudo, demonstrar que quem está escrevendo gosta e entende de videogame.
O futuro não é uma guerra entre “jornalistas x youtubers”. É uma convergência. Os veículos que sobreviverem serão aqueles que entenderem que a credibilidade não se conquista com um domínio .com, mas com autoridade construída dia após dia perante uma comunidade que está cada vez mais esperta e exigente.
