Por Que Mike é o Personagem Mais Hipócrita de Breaking Bad? – Explicado

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Ah, Breaking Bad… A série que redefiniu o drama televisivo, nos presenteando com uma galeria de personagens complexos, multifacetados e, em muitos casos, moralmente ambíguos. No entanto, se há um nome que ecoa com uma ressonância particular quando falamos de contradições, esse é Mike Ehrmantraut. O ex-policial corrupto, o soldado leal de um chefe do cartel, o avô carinhoso, e, ao mesmo tempo, um homem supostamente justo. É possível que ele seja tudo isso? Sim, e é exatamente essa dicotomia que o torna um dos personagens mais intrigantes – e, ouso dizer, o mais hipócrita – de todo o universo de Vince Gilligan.

Por muito tempo, a percepção geral de Mike foi a de um “limpador” eficiente, um homem de poucas palavras que resolvia problemas sem fazer perguntas desnecessárias. Sua introdução em Breaking Bad já nos deu essa primeira impressão: um sujeito misterioso que entra na casa de Jesse Pinkman, limpa a bagunça que poderia incriminá-lo pela morte de Jane, e simplesmente se vai. Não sabemos seu nome, sua origem, apenas que ele está ali para “limpar as coisas”. Um faz-tudo, alguém que se infiltra e completa a tarefa, seja qual for. Essa apresentação enigmática logo sinalizou que Mike seria um personagem útil para todos na série, desde vigiar Walter para evitar sua prisão até ajudar Saul Goodman a manter a ordem e eliminar qualquer um que se intrometesse no caminho de seu chefe, Gus Fring.

Mas por trás da fachada de “limpador profissional” e do código de conduta que ele tanto alardeava, reside uma teia de contradições que, quando desvendada, revela a verdadeira face da hipocrisia de Mike Ehrmantraut. Prepare-se para questionar tudo o que você pensava saber sobre ele, porque Vince Gilligan, com sua genialidade sutil, deixou essa verdade escancarada o tempo todo. E neste artigo, vamos destrinchá-la ponto a ponto, mergulhando nas profundezas de sua trajetória e expondo as rachaduras em sua armadura moral.

Por Que Mike é o Personagem Mais Hipócrita de Breaking Bad? - Explicado
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A Raiz da Corrupção: Muito Antes de Gus Fring

Para entender a hipocrisia de Mike, precisamos voltar no tempo, muito antes de ele se tornar a mão direita de Gus Fring. A verdade é que Mike já era um criminoso muito antes de conhecer o magnata do frango frito e da metanfetamina. Por anos, enquanto trabalhava na polícia da Filadélfia, Mike aceitava subornos de forma constante. Ele fazia vista grossa para crimes de traficantes de drogas, passava informações privilegiadas dentro da polícia e até mesmo encobria outros crimes internamente. Para Mike, não importava quem eram os “bandidos” ou o que eles queriam; ele só se preocupava em realizar o acordo.

Essa conduta não apenas destruiu sua própria moral, mas tragicamente afetou toda a sua família. Seu filho, Matty, que também era policial, era um homem honesto, um tipo diferente de policial. Quando Matt foi confrontado com a oferta de suborno junto com seus colegas, ele inicialmente recusou. Foi o próprio Mike que o convenceu a aceitar, argumentando que a recusa faria com que ele fosse visto como um traidor dentro da corporação. Uma decisão que selaria o destino de seu filho de forma brutal.

A morte de Matty foi mais do que uma armadilha para Mike; foi o peso de todas as suas decisões e anos corrompendo o próprio sistema que se voltou contra ele. Perder seu filho, que nunca quis fazer parte daquele jogo e que genuinamente desejava ser um bom policial, é a prova máxima de como Mike havia perdido a noção dos limites morais e das consequências inevitáveis. Ele não entendia mais até que ponto se podia cruzar a linha sem sofrer as consequências, algo que os policiais corruptos que mataram seu filho sabiam muito bem.

Este é o primeiro pilar da hipocrisia de Mike: ele se via como um pragmático, um homem que entendia as “regras do jogo”, mas falhou em reconhecer que suas ações corroíam não apenas a sociedade, mas também as pessoas que ele mais amava. A tragédia de Matty é a cicatriz de sua própria moralidade transigida, um evento que, de certa forma, o transformou ainda mais frio e calculista.

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A Nova Vida em Albuquerque: Velhos Hábitos, Novas Justificativas

Após a trágica morte de seu filho, Mike se muda para Albuquerque e se aproxima de sua neta, Kaylee, e de sua nora, Stacey. Muitos poderiam pensar: “Bem, agora que ele aprendeu a lição, não viverá mais neste mundo sombrio, certo? Ele sabe que, no final, tudo terminará em mais mortes”. Ah, mas não é bem assim.

Ao chegar no Novo México, Mike conhece Saul Goodman, na época ainda Jimmy McGill, enquanto trabalha no estacionamento de um tribunal. E, mesmo após algumas desavenças iniciais, a dupla se ajuda mutuamente. Primeiro, Saul derrama café em um detetive para que Mike possa roubar um caderno com anotações da investigação sobre a morte dos policiais que mataram seu filho. Em retribuição, Mike invade a casa de um casal que escondia milhões de dólares roubados, pega o dinheiro e o entrega a Saul, que queria encontrar uma maneira de reduzir as sentenças de seus clientes. Ele até mesmo o entrega para Kim Wexler.

É curioso notar que Mike parecia ter certeza de que Saul ficaria com o dinheiro, ou pelo menos com parte do suborno que havia aceito do casal. Ao devolver o dinheiro, Mike questiona. Isso demonstra que ele sempre soube reconhecer pessoas facilmente influenciadas pelo dinheiro e por más ações. Ele chega a julgar Saul severamente, perguntando “Como você sabia que eu derramaria aquele café?” quando Saul o ajuda pela primeira vez. A resposta de Mike é incisiva: “Eu conheço os do seu tipo e esse limite duvidoso que você sempre cruza quando tenta fazer a coisa certa”. Ele basicamente diz: “Você é um amador”.

Essa capacidade de julgamento, e até mesmo essa ironia, de alguém que tenta se colocar acima da pura ganância, pode, em alguns casos, separá-los. Em certo momento, é Mike quem investiga a vida de Walter White e adverte que não seria uma boa ideia trabalhar com ele, descrevendo-o como um amador em quem não se deveria confiar, mesmo que Walter agisse por pura ambição. Além disso, quando Mike rouba o dinheiro do casal, ele poderia ter simplesmente ficado com os milhões, levado sua família e partido da cidade.

O que diferencia Mike dos demais – ou pelo menos o que ele finge acreditar – é seu código. Por mais corrupto que fosse, Mike não se via como um tipo movido pela ganância, como Saul ou o próprio Walter. Para ele, você pode ter o que quiser, mas não precisa agir com total descontrole para atingir seu objetivo. Não precisa agir por impulso; basta escolher conscientemente. Essa é a essência de sua autojustificação, uma fachada para suas próprias escolhas.

A Aliança com Gus Fring: O Pragmatismo Corrompido

Assim que conhece Gus Fring, Mike rapidamente se torna sua mão direita. Ao contrário de outros traficantes insanos como os Salamanca, Gus é frio e metódico. Ele não se deixa levar por emoções e, embora busque ser o dono de um império, age com calma e não vive em função de seu ego. Esses pontos em comum fazem com que Mike se identifique rapidamente com Fring , apesar de Gus ser um tipo que facilmente poderia eliminar um membro da equipe sem praticamente demonstrar qualquer reação.

Tanto é assim que Mike não se importava em seguir as ordens de Gus, matar pessoas de cartéis rivais e sequer questionar Fring por trabalhar com crianças nas ruas, que poderiam ter a idade de sua própria neta. Para Mike, tudo isso era preferível a fazer negócios com Walter White. Quando Gus morre, Mike afirma diversas vezes que tinham um bom acordo com Fring. Mesmo podendo ser um dos chefes e tomar decisões que evitariam tanta destruição, para ele, era melhor trabalhar com um psicopata organizado do que com um psicopata ganancioso.

E sim, isso é uma hipocrisia enorme. Mas isso não se aplica apenas a Walter White. Na cabeça de Mike, ele se vê como alguém diferente dos outros criminosos. Apesar de estar no jogo, ele não é “como eles”. Mesmo matando pessoas, Mike sempre diz que quer evitar que isso aconteça tanto quanto possível. Por isso, ele não mata pessoas inocentes e até elabora planos para evitar o pior com pessoas que talvez nem mereçam.

Um exemplo marcante é quando ele conhece Nacho Varga, que o contrata para matar Tuco Salamanca. Mike poderia ter simplesmente feito o trabalho, mas prefere apanhar de Tuco para que este seja preso e passe alguns anos na cadeia. Poderíamos pensar: “Bem, Mike só mata por necessidade, só o fará se não houver outro jeito”. Isso até poderia ser verdade, como no caso de Werner Ziegler, o engenheiro alemão encarregado de construir o laboratório, com quem Mike desenvolveu uma amizade. Quando Ziegler tenta fugir para ver sua esposa, Mike se esforça para encontrá-lo antes dos homens de Gus para evitar que ele seja morto.

No entanto, mesmo fazendo de tudo para evitar uma tragédia, quando Gus ordena a morte de Ziegler, Mike lamentavelmente sabe que deve cumprir. E, naquele momento, sim, era uma necessidade. Ele deu a Werner o melhor final possível naquela circunstância, evitando que Ziegler fosse torturado de forma mais cruel pelos capangas de Fring, impedindo que sua esposa fosse pega e permitindo que ele se despedisse dela por telefone, deixando-o, de uma forma triste, menos solitário.

A Contradição Final: Jesse Pinkman e as “Meias Medidas”

Mas e quanto a Jesse Pinkman? Por que Mike pede a Walter que se livre dele, sendo que várias vezes na série parece que ele gosta de Jesse? No episódio “Half Measures” (Meias Medidas), da terceira temporada, quando Jesse começa a causar problemas para Gus , Mike vai até Walter e lhe conta uma história de quando era policial. Ele era sempre chamado à casa de uma mulher que apanhava constantemente do marido. Uma noite, ele leva o agressor a um lugar deserto, aponta a arma para sua boca e, em vez de matá-lo, simplesmente o adverte para deixar a mulher em paz. Duas semanas depois, o homem a assassina.

A lição que Mike tenta ensinar a Walter é clara: “Não se contente com meias medidas, livre-se do problema”. E o problema, nesse caso, era Jesse. Até que ponto Mike vai em sua ânsia de evitar mortes e pagar por alguém tão diferente, quando, diante da primeira grande ameaça, ele age como todos os outros? Quão “bom” ele se considera, tentando por todos os meios derramar mais sangue com um garoto que tomou decisões tão ruins?

Afinal, a única lealdade de Mike é a um código que ele sempre tenta seguir, e seu espírito de equipe acaba sendo maleável de acordo com seus próprios interesses. E se ele busca justificar suas atitudes e decisões por fazer parte desse “jogo” para cuidar de sua família, isso é realmente o melhor para ela? Pensemos: se seu filho estivesse vivo, um bom sujeito como ele, como se sentiria ao saber de onde veio todo aquele dinheiro? Ou até mesmo sua neta, quando fosse usá-lo? Se alguém de alguma forma identificasse como ele conseguiu tanto dinheiro, isso poderia deixá-la em sérios apuros.

Por mais que Mike insista em ser diferente e seguir alguns códigos éticos, ele, assim como os outros, não recusa o dinheiro fácil. E, mesmo passando toda a série tentando resolver os problemas de todos, há um que ele jamais conseguiu solucionar: a destruição que causou a si mesmo e à sua família. E nem todo o dinheiro do mundo seria capaz de consertar isso. Assim como Jesse Pinkman, que começa a série com medo de matar até mesmo um burro e depois se torna um dos maiores vilões de Breaking Bad. Mas essa é uma história para outro vídeo, que você pode conferir aqui na tela.

A hipocrisia de Mike Ehrmantraut reside justamente nessa autoilusão. Ele se vê como um homem de princípios em um mundo sem eles, um estrategista em meio ao caos, um protetor em um mar de lobos. No entanto, suas ações revelam que ele é tão parte do sistema corrupto quanto aqueles que ele tanto despreza. Ele critica a ganância de Walter, mas é a mesma ganância, velada pela “necessidade” de proteger a família, que o leva a cometer atos hediondos. Ele se diz um homem de “meias medidas” que aprendeu a lição, mas insiste em “medidas completas” quando lhe convém.

No fim das contas, Mike é um espelho para a própria complexidade moral de Breaking Bad: ninguém é totalmente bom ou totalmente mau. Mas enquanto alguns personagens abraçam sua escuridão, Mike a nega, a justifica, a disfarça com um véu de pragmatismo e lealdade. E é essa negação, essa pretensão de superioridade moral, que o eleva ao posto de personagem mais hipócrita da série. Uma verdade fria, mas inegável, para um homem que sempre buscou o controle em um mundo que ele mesmo ajudou a descontrolar.

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